Nesta entrevista, o
coordenador da Comissão Justiça e Paz da Diocese de Santarém, Padre Edilberto
Sena, responde ao vereador Maurício Correa (PSD) que, em sessão da Câmara
semana passada disse que o padre foi ao plenário disseminar
"lambanças". Edilberto, ao falar numa reunião aberta ao público,
queixou-se de que a maioria dos vereadores não se empenham na solução dos
problemas do município, sobretudo os problemas trazidos pela economia de
exportação de matérias primas, com a abertura e ampliação de novos portos.
Por Manuel Dutra, em seu blog
De modo geral, o religioso faz aqui uma análise daquela reunião e diz
que está aberto ao diálogo com a Câmara de Vereadores, desde que esta o queira.
A respeito da contaminação do Rio Tapajós e de vários de seus afluentes
pelos rejeitos venenosos da garimpagem, diz Edilberto que "nós, do
Movimento Tapajós Vivo, sentimos o problema, mas analisamos que neste momento
barrar as hidrelétricas é mais urgente e tão, ou mais grave do que a poluição
dos garimpos. Não temos pernas para assumir as duas lutas e não creio que
possamos enfrentar as duas ao mesmo tempo. Assim, esperamos que outros grupos
entrem na pressão contra as poluições dos garimpos".
A seguir, a entrevista:
Pergunta - No jornal O Impacto tu dizes que foste
mal interpretado pelos vereadores. Onde está o mal-entendido?
Resposta - O mal entendido deles, quanto à minha fala, foi que não falei que eles sejam otários, nem os chamei de corruptos. Falei que os empresários podem implantar suas empresas, mas não onde e como querem. NÃO SOMOS OTÁRIOS. Isto é, não somos ingênuos para aceitar passivamente o que eles querem. Além disso, falei que nós do plenário não podemos nos fiar nos políticos para defender nossos direitos e nosso território. Com isso, falava que até agora, mais de um ano depois de os projetos dos portos estarem em andamento, os políticos não tomaram posição na defesa dos nossos direitos. pelo contrário, o vereador Matias Junior e o vereador Henderson Pinto já manifestaram anteriormente que são a favor dos portos graneleiros no bairro Área Verde, quando a maioria dos moradores está contra e nós da Pastoral Social da Diocese também.
P - Segundo o mesmo jornal o vereador
Maurício Correa (PSD) disse que "o padre não poderia ter usado a tribuna
do Poder Legislativo para usar da demagogia, fazendo lambança, para ser
aplaudido e eu o repudiei em defesa do Poder Legislativo". Qual seria a tua
resposta ao referido vereador?
R - A acusação do vereador Maurício
Correa de que eu estava fazendo lambança é sua interpretação. Eu estava ali
como membro da sociedade civil santarena que defende o respeito aos direitos da
população. Não entendo como o dito vereador achou, que eu estivesse agredindo a
Câmara de Vereadores, quando o que disse foi que eles foram eleitos por nós
para defender os direitos da população e que, portanto, assumissem seu papel.
Não é o que estamos vendo no caso dos projetos, tanto do aumento do porto da
Cargill, destruindo o bosque e campo da Vera Paz, e eles não abriram as bocas,
como no caso dos portos novos em discussão, não ouvimos ainda eles tomando
posição em defesa dos moradores e da cidade de Santarém, com exceção da vereadora
Ivete Bastos (que justiça se faça, tem sido uma das poucas que sempre defende
os interesses da população). Então, quem tem feito demagogia são os políticos
que, em tempo de campanha, prometem maravilhas aos eleitores e depois de
eleitos se calam diante das agressões aos direitos da população.
P - A partir desse episódio ainda há possibilidade de diálogo
com a Câmara Municipal?
R - Possibilidade de diálogo com a
Câmara de vereadores, da minha parte não me fecho, estou sempre pronto ao
diálogo e ao debate de ideias e propostas. Se eles fecharem as portas da
"casa do povo" tenho outras portas abertas para continuar minha
missão como coordenador da Comissão Justiça e Paz e como cidadão santareno.
P - Os atuais vereadores têm
condição de exigir uma revisão dos projetos em andamento no município,
referentes à construção de portos para exportação de grãos e também no caso do
loteamento da Buriti, além de outros?
R - Condição responsável eles têm de
rever todos esses projetos de empreendimentos em andamento na cidade. Se eles
têm vontade de enfrentar a força do poder econômico é que duvido. São poucos os
vereadores/as que tomam posição firme diante do que acontece na cidade e no
município. Alguns exemplos de omissão: a ampliação do porto da Cargill, a
discussão sobre esses projetos tão impactantes de 3 ou 4 portos na área da APA
Maicá, a questão do desastroso projeto Minha Casa minha Vida, os loteamentos
que estão sendo abertos na região do Eixo Forte e coroando as omissões da
Câmara de Vereadores é o escandaloso caso do dito empreendimento Buriti. Quando
foi que a dita Câmara tomou posição firme na defesa dos direitos ao território
da cidade? Que saiba quem tem assumido as dores tem sido pequenos grupos dos movimentos
sociais populares. Então, ao contrário da queixa que eu teria ofendido o poder
legislativo, sinto que aquele poder é que tem se omitido constantemente diante
de graves agressões à população santarena.
P - Na tua análise e na
análise da Comissão Diocesana de Justiça e Paz, quais os principais problemas
que hoje afetam a cidade e o município e que são ameaças futuras?
R - Na minha análise, Santarém está
sendo agredida por tantos projetos do dito progresso. Além do que já apontei,
acrescento: o tráfego na rodovia Santarém Cuiabá dentro da cidade. Cinco
bairros desde a descida da serra do Piquiatuba, não têm nenhuma proteção às
vidas humanas: não há placas de redução de velocidade, não há lombadas, não há
calçadas para pedestres. Lideranças daqueles bairros já realizaram vários
encontros em busca de solução, pois vários acidentes já ocorreram, inclusive
com mortes. Em uma das reuniões dos bairros compareceu um vereador, que
mostrou-se preocupado, mas não compareceu nas outras reuniões. A Câmara de
vereadores nunca tomou posição na defesa dos moradores. Para ironia da vida,
mais recentemente o DENIT, responsável pela proteção das vidas humanas,
realizou duas obras: recuperou o asfalto da rodovia apenas para os veículos,
sem construir calçamentos para pedestres, nem redutores de velocidade e, para
coroar o desprezo pelos seres humanos dos cinco bairros, colocou vários "pardais"
desde o porto da Cargill até o viaduto. Os vereadores nunca exigiram que o
DENIT respeitasse a defesa das vidas ao menos até o pé da serra.
P - Como tu analisas a realização da manifestação deste domingo,
em Santarém, contra as hidrelétricas do Tapajós, especialmente a de São Luiz, a
mais adiantada?
R - As manifestações de domingo
passado foram um avanço na demonstração de que mais pessoas e organizações da
sociedade civil organizada estão acordando para os graves impactos que as
hidroelétricas no Tapajós trarão para nós. Não foi só em Santarém que ocorreram
as manifestações, mas em Belterra, Aveiro, Itaituba, Jacareacanga. As mais
amplas foram em Itaituba e Santarém, com participantes de bairros, comunidades
rurais, escolas e universitários. Apenas um vereador esteve presente.
Compreendemos que a única forma de enfrentarmos o perverso projeto do
governo para o Tapajós é trabalharmos a união de vários movimentos populares,
igrejas e povo Munduruku, ao estilo Chico Mendes. Desafio maior é abrir os
olhos das populações não indígenas, principalmente das cidades da bacia do
Tapajós. Sem isso vamos cair na mesma desilusão do povo do Xingu. Nossa
vantagem é que o governo está metido na arapuca da crise internacional com
reflexos na economia brasileira (O BNDES não poderá mais abrir o cofre a
qualquer custo) e o "lava a jato" é outro aliado, pois as
empreiteiras estão metidas nos crimes e se for feita justiça não poderão mais
fazer obras públicas. Enquanto isso vamos trabalhando a sensibilização das
comunidades tapajônicas, mesmo lutando sem recursos e sem apoiadores políticos
e classe média.
P - Como vês a degradação ambiental causada pelos garimpos industriais do médio Tapajós, que ameaça os sete municípios daquela região, com o despejo de mercúrio, cianeto e barro? Essa questão, acoplada ao caso dos projetos de hidrelétricas, como tu analisas?
P - Como vês a degradação ambiental causada pelos garimpos industriais do médio Tapajós, que ameaça os sete municípios daquela região, com o despejo de mercúrio, cianeto e barro? Essa questão, acoplada ao caso dos projetos de hidrelétricas, como tu analisas?
R - A poluição do rio e dos povos pelos garimpos é outro crime grave e que não tem tido ação das autoridades e pouco da sociedade. Já na década de 90 nós do Grupo de Defesa da Amazônia, lutamos contra o Estado brasileiro e paraense por causa da poluição mercurial dos garimpos. Fomos até a capital holandesa com a denúncia contra o governo brasileiro e Estado do Pará. Houve uma condenação moral, mas nada de punição aconteceu. Nós do Movimento Tapajós Vivo sentimos o problema, mas analisamos que neste momento barrar as hidroelétricas é mais urgente e tão, ou mais grave do que a poluição dos garimpos. Não temos pernas para assumir as duas lutas e não creio que possamos enfrentar as duas ao mesmo tempo. Assim, esperamos que outros grupos entrem na pressão contra as poluições dos garimpos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário